Furo a embargo internacional
Escândalos da democracia. OGMA, MPLA e Indonésia amigos
OGMA vendeu helicópteros ao MPLA e reparou dois motores à Força Aérea Indonésia
Há coisas que não se esquecem. Na década de 90, os portugueses não esqueciam a guerra civil de Angola, que opunha o MPLA, o FNLA e a UNITA. E não esqueciam Timor, sobretudo o dia de 1991 em que o Exército indonésio disparou sobre manifestantes no cemitério de Santa Cruz, em Díli, matando 200 pessoas. Por isso, foi com choque que em Novembro de 1994 descobriram que o país tinha vendido helicópteros ao MPLA e, logo depois, que as Oficinas Gerais de Material Aeronáutico (OGMA) tinham reparado dois motores de helicópteros da Força Aérea Indonésia.
« Em 1993, as Oficinas Gerais de Material Aeronáutico repararam vários motores de helicópteros Puma, da Força Aérea da Indonésia. Foi já depois do massacre de Santa Cruz. Os próprios contentores tinham a indicação de origem. O negócio foi feito através de uma empresa francesa e põe em xeque a política externa no caso de Timor. O Independente investigou e as OGMA acabaram por confirmar. Nogueira (Ministro da Defesa do Governo de Cavaco) diz que não sabia. » - Jornal Independente, 20 de Janeiro de 1995
Quando o escândalo rebenta, estamos na ponta final do segundo mandato de Cavaco Silva. A venda de helicópteros ao MPLA e a manutenção de aviões de combate da Força Aérea de Angola provoca grande polémica porque o acordo de cooperação entre os dois países é assinado em Junho de 1993, depois de a ONU ter proibido ajuda militar a todas as facções em conflito. O caso tem consequências imediatas: o director das OGMA, o brigadeiro Adriano Portela, pede a demissão; o Presidente da República, Mário Soares, critica o governo e não reconduz o chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, general Mendes Dias; Jonas Savimbi reclama o afastamento de Portugal das negociações de paz. A 14 de Dezembro, o Parlamento aprova um inquérito à actuação do ministro da Defesa, Fernando Nogueira.
« É um documento secreto que compromete o Ministério da Defesa (do Governo Cavaco). O Governo (de Cavaco Silva), através das Oficinas Gerais de Material Aeronáutico, vendeu helicópteros de guerra ao MPLA. Fez 263 operações de manutenção militar, incluindo nos MIG, em Angola. Tudo em 1993, quando a guerra voltou, Portugal era mediador e havia embargo. Nogueira (Ministro da Defesa do Governo de Cavaco) não conseguiu dar explicações. » - Jornal Independente, 25 de Novembro de 1994
A OGMA confirmou o negócio. A manutenção fora feita nos armazéns de Alverca durante os meses de Abril a Agosto e o preço tinha sido 20 mil contos (100 mil euros). O director das OGMA, brigadeiro Portela, confirmou a reparação mas, segundo ele, o cliente era uma empresa francesa, a Turbomeca, e não os indonésios: "Os franceses, com base no acordo de subcontratação, enviam-nos dezenas de motores por ano para manutenção e nós não sabemos, nem vamos verificar, de quem é esse material." Ainda assim, reconheceu existir um lapso na comunicação entre a administração e os trabalhadores. "Houve uma falha no nível intermédio, que é preciso apurar. É evidente que se eu soubesse nunca teria autorizado a manutenção."
« O Independente revela as cartas que provam que a empresa controlada pelo Governo ( de Cavaco Silva) levou o negócio até ao fim. E as procurações que provam como a operação subiu até 91 milhões de dólares em armamento. » - Jornal Independente, 22 de Julho de 1994
O ministro Fernando Nogueira garantia desconhecer o negócio mas, apesar disso, o caso continuava a provocar baixas. Em poucos meses, mudam as administrações da Indep (Indústrias e Participações de Defesa, SA) e da Spel (Sociedade Portuguesa de Explosivos, SA). Um António Guterres "verdadeiramente estupefacto e verdadeiramente chocado" escreve a Cavaco Silva e pede a demissão do ministro da Defesa. O secretário--geral do PS diz que a acção de Portugal na defesa dos direitos do povo de Timor está "gravemente posta em causa na sua credibilidade e eficácia".
Nessa altura já era evidente que Cavaco Silva não seria candidato à presidência do PSD. O nome de Fernando Nogueira era o nome mais repetido e o que fazia manchetes ao lado de Durão Barroso. Nogueira acabou por ser eleito no PSD, mas perdeu as eleições legislativas para António Guterres em Outubro de 2005. Meses antes, o Parlamento tinha votado o arquivamento do inquérito. A maioria social-democrata entendeu que "as OGMA tinham autonomia" e que "o governo não sabia" das suas actividades.
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